Pista da Marquês de Sapucaí: Refit vai patrocinar carnaval do RJ

O patrocínio relâmpago da Refit, 2ª maior devedora do estado, ao carnaval do RJ

Nos últimos dias, a tensão predominou nos barracões das escolas de samba do Grupo Especial do Rio de Janeiro. Algumas temiam até não ter o dinheiro suficiente para pagar o transporte dos carros alegóricos para a Marquês de Sapucaí. Nesta quinta (20), porém, a salvação chegou: um patrocínio de R$ 20,5 milhões da Refinaria de Petróleos de Manguinhos (Refit).

A notícia foi dada em primeira mão pelo jornal O Globo. Na reportagem, o subsecretário de Grandes Eventos do governo de Wilson Witzel, Ruan Lira, comemorou o patrocínio, depois que a Light pulou fora do negócio. O que chama a atenção é que a parceria com a Liesa, intermediada pelo estado, acontece com uma das maiores devedoras de impostos em território fluminense.

Os números são conflitantes, mas, de acordo com documentos que constam de uma ação que corre na 2ª Vara de Fazenda Pública do Tribunal de Justiça do Rio, a Refit possuía, em janeiro de 2019, nada menos do que 207 débitos inscritos em Dívida Ativa com o estado. O valor, à época, ultrapassava R$ 5,1 bilhões. Já dados de setembro passado, do gabinete do deputado Luiz Paulo (PSDB), levantados na CPI da Dívida Ativa, mostram um valor de R$ 3,4 bilhões. Fato é que a empresa é a segunda maior devedora.

O caso das dívidas também foi noticiado nesta sexta (21) pelo “Correio da Manhã”.

“Novo modelo de PPP”

A reportagem de O Globo – que tem um camarote na Marquês de Sapucaí com a Refit como um dos patrocinadores – trata o desfecho das negociações como um “final feliz”. Mas a história é cercada de lacunas. O texto também classifica a iniciativa como uma “parceria público-privada”. Mas os envolvidos afirmam que não haverá isenção fiscal. O dinheiro parte apenas da empresa. Nesse “novo modelo de PPP”, o estado teria somente ajudado nas negociações com uma de suas maiores devedoras.

“As contrapartidas são negociadas diretamente entre a Refit e a Liesa, e devem envolver ações publicitárias e exploração da marca na Avenida”, diz o texto de O Globo. Ou seja, a empresa deu R$ 20,5 milhões do dia para a noite, mas mal há a certeza da forma de compensação.

O fechamento do negócio aconteceu logo após os presidentes das escolas de samba terem ido ao Palácio Guanabara posar para fotos e vídeos com o governador Wilson Witzel. “Nunca vamos deixar o samba morrer!”, disse.

Litígios com o estado

A participação do governo no negócio chama a atenção porque há uma série de litígios envolvendo a Refit. Enquanto o poder público cobra as dívidas de impostos, a empresa processa o estado por causa da desapropriação de um terreno, realizada em 2012, durante a gestão de Sérgio Cabral, que teria causado prejuízos milionários.

Em março do ano passado, a Refit – que está em processo de recuperação judicial – chegou a ganhar em primeira instância. O valor preciso da indenização seria calculado posteriormente, através de uma perícia.

Mas o estado está recorrendo. No documento de apelação, o procurador Rodrigo Tostes de Alencar Mascarenhas afirma que não a desapropriação do terreno, mas o envolvimento da refinaria em ilícitos a levou a graves perdas financeiras.

Em São Paulo, a Refit também acumula disputas com o estado na Justiça. O governo paulista calcula que a dívida da empresa esteja em R$ 3,4 bilhões. Em novembro, o STF restabeleceu o cancelamento da inscrição da refinaria.

Resolução nebulosa

Nesta quinta (20), enquanto eram concluídas as negociações para o patrocínio, uma nebulosa resolução da Secretaria estadual de Cultura foi publicada em Diário Oficial com “regras para apresentação de projetos culturais concernentes ao carnaval que envolvam escolas de samba e sua entidade de representação coletiva, em regime de ‘coproponência'”

O artigo IV da resolução diz que “será admitida, a título de reembolso, a apresentação de contas de despesas realizadas em até 180 dias antecedentes à data de publicação da concessão do beneficio fiscal”.

Ou seja, o texto abre caminho para que uma isenção fiscal seja concedida já depois da realização dos desfiles das escolas de samba, dando reembolso de despesas realizadas até seis meses antes da publicação.

Outra curiosidade: os pareceres que embasam a medida foram colocados em “acesso restrito” no sistema de processos públicos do governo estadual. Ou seja, não estão disponíveis para que a população possa ver o teor.

Para o deputado Luiz Paulo, a resolução é temerária:

“A Refit doa, a Liga recebe (escolas), o estado dá o benefício fiscal à Refit, em devolução, e o consumidor paga. Há que se revogar a resolução”.

Outro lado

A assessoria de imprensa do governo estadual negou que haja incentivo fiscal no patrocínio feito pela Refit.

A Secretaria estadual de Cultura afirmou que “os pareceres da resolução estão restritos e não em sigilo”. “Com isso, os participantes do processo podem ter acesso livremente. Isso é necessário para evitar que outras pessoas, que não terão participação, possam inserir informações ao longo do processo. A necessidade de publicidade é do ato administrativo, no caso a Resolução, e não dos pareceres. Isso não impede o acesso de qualquer pessoa ao processo na íntegra, mediante solicitação, em atendimento a Lei de Acesso à Informação (LAI)”.

O blog então pediu o envio dos documentos através da assessoria de imprensa, mas a pasta disse que a solicitação só seria aceita via LAI. O pedido só começaria a tramitar na quinta (27), com prazo de 30 dias para resposta.

*Foto em destaque: Pista da Marquês de Sapucaí, onde acontecerão os desfiles das escolas do Grupo Especial

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