Rio Beach Club, casa de festas que funciona à revelia da Justiça no RJ

Rio Beach Club, o carnaval que vai passar por cima da Justiça

Frequentada por políticos de diversos partidos, atletas de renome e tendo entre os donos um ex-funcionário comissionado da prefeitura, a casa de eventos Rio Beach Club, na Barra da Tijuca, é a prova de que a Justiça em solo carioca tarda para se tornar realidade. Em maio do ano passado, a 8ª Câmara Cível do TJ-RJ determinou a interdição do local até que fossem realizadas ações de tratamento acústico que minimizassem os transtornos aos moradores da região e a situação do espaço fosse regularizada com a Administração Municipal. Na prática, porém, nada acontece.

De lá para cá, foram realizadas diversas festas sem que a interdição fosse devidamente cumprida. Os eventos levaram o Ministério Público estadual a entrar com uma nova ação, de execução da sentença, para que aquilo já havia sido determinado pela Justiça acontecesse na prática. Em 5 de dezembro do ano passado, a 6ª Vara Empresarial acatou o pedido do MP, que ainda incluía o pagamento de uma multa de R$ 1,6 milhão em 15 dias. O que aconteceu? A realização de mais festas, inclusive durante o período de réveillon, com ingressos que chegaram a R$ 800.

Na última segunda (17), foi dada uma nova ordem de interdição na mesma ação de execução da sentença. O que não parece, no entanto, fazer efeito para o Rio Beach Club. Ingressos para a série de eventos “Feverê”, entre o sábado e a quarta-feira de Cinzas, continuam sendo comercializados normalmente. Há dias em que o valor da entrada é de R$ 650 para homens. O mesmo filme caminha a passos largos para se repetir.

Festas de políticos

A ação civil pública movida pelo MP começou a tramitar em 2016, após diversas queixas de moradores da Ilha da Coroa, na Barra da Tijuca, que residem perto do Rio Beach Club. Em março de 2018, a juíza Maria Cristina de Brito Lima, da 6ª Vara Empresarial, considerou improcedente o pedido de interdição. Em 28 de maio do ano passado, porém, a decisão foi revertida em segunda instância. Mas, na prática, não é cumprida.

Mesmo com a ordem de interdição, a casa de eventos não só continuou funcionando, como ainda serviu de palco para festas de políticos. Em julho de 2019, o deputado estadual Alexandre Knoploch (PSL) “convocou” os convidados para a “missão” de seu aniversário no local.

Em setembro, foi a vez de o vereador Marcello Siciliano (Podemos) fazer “questão da presença” dos amigos.

Em dezembro, houve uma festa de confraternização de funcionários do vereador licenciado e atual secretário municipal de Envelhecimento Saudável, Qualidade de Vida e Eventos, Felipe Michel.

Também passou por lá, mas como convidado de uma festa, o deputado federal Pedro Paulo (DEM), que disse que compareceu a diversos outros eventos de fim de ano “na Zona Oeste, Norte e em comunidades” e também não perguntou “se o salão de festas tinha alvará, habite-se, certificado do Corpo de Bombeiros etc.” “Farei da próxima vez”, afirmou.

Já Felipe Michel disse que a festa foi feita com a colaboração de diversos funcionários e que ele permaneceu no evento apenas por cerca de meia hora.

O blog não conseguiu contato com Alexandre Knoploch e Marcello Siciliano. O espaço segue aberto para os citados.

Além de políticos, a casa também foi palco de uma festa de Vinícius Júnior, do Real Madrid, em junho do ano passado, já depois da decisão de interdição. Em julho, o jogador de vôlei Bruninho também participou de um evento no local.

“Ilegálizável”

Um capítulo à parte na história do Rio Beach Club são os trâmites que envolvem a casa de eventos na prefeitura do Rio. Em abril de 2017, Thiago Barcellos, então superintendente da Barra da Tijuca, chegou a classificar o espaço como “ilegalizável” durante uma operação que interditou o local. Segundo ele, pelo zoneamento urbanístico da região, não havia como um espaço daquele tipo, com shows, estar aberto.

Entre idas e vindas, em dezembro de 2018, a empresa RMGX Comércio e Serviços Náuticos, que funciona na área do Rio Beach Club, teve o alvará anulado.

Então, logo em seguida, em janeiro de 2019, uma outra empresa, funcionando no mesmo local, a Clube Recreativo Rio Beach Club, recebeu um novo alvará. Os sócios da companhia são os mesmos da RGMX: Rômulo Vianna Groisman e Rafael Liporace de Souza Pereira.

Com a série de eventos perturbando a vizinhança, a gerência local de fiscalização emitiu diversos autos de infração para o clube. Mas, como as multas são baixas – de cerca de R$ 850, de acordo com a legislação vigente -, não serviram para coibir as festas.

No fim de 2019, já depois de a Justiça ter determinado a interdição, de forma inusitada, a Secretaria municipal de Fazenda afrouxou os limites para o alvará do Rio Beach Club, incluindo a possibilidade de grupo musical, bar e restaurante. Ainda assim, não ficaram permitidos sons que incomodassem a vizinhança.

A Secretaria municipal de Fazenda afirmou que “não há qualquer impedimento legal na atual legislação para que isso ocorra (concessão do alvará)”.

Contratos com a prefeitura

Um dos sócios que está à frente do Rio Beach Club é o empresário Rafael Liporace de Souza Pereira, que, em setembro de 2017, chegou a ser nomeado para um cargo de assessor especial do Riocentro. Ele também figurou como diretor do Rio Eventos. A prefeitura afirmou que ele deixou os quadros do município em dezembro de 2018.

Através de outras empresas, os sócios do Rio Beach Club têm conquistado contratos com a prefeitura. No carnaval de 2017, a empresa Liporace Marketing, de Rafael Liporace, ganhou o direito de uso dos camarotes do município no setor 9A da Marquês de Sapucaí. Ele foi o único a participar da concorrência e levou o espaço por R$ 240 mil, preço mínimo estipulado.

Para o carnaval de 2018, a agência A Vera, dirigida por Rômulo Groisman, ganhou da Secretaria de Cultura o direito de ocupação do Terreirão do Samba, também como a única concorrente. O mesmo aconteceu em 2019 com a Mood Mídias e Marketing, também de Groisman. Para este ano, já sob a batuta da Riotur, a vencedora foi novamente a agência A Vera.

No passado, em 2010, o empresário Rafael Liporace ganhou a medalha Pedro Ernesto, maior honraria da Câmara do Rio, do então vereador e atual deputado estadual Carlo Caiado (DEM).

“Homenageei o Rafael Liporace em 2010, com a entrega da Medalha Pedro Ernesto pela sua atividade como professor, jovem empreendedor premiado à frente do Biruta Mídias Mirabolantes”, disse Caiado. “Não tenho nenhuma relação com o Rio Beach Club”, completou.

Perguntas sem resposta

O blog entrou em contato com o Rio Beach Club através do e-mail que consta do site da casa, assim como enviou perguntas para os dois escritórios de advocacia, de Marcos de Pinho Teixeira Alves e de Rodrigo Fux, que representam a empresa RGMX na ação civil pública em que ela é ré, mas não houve retorno.

Ficaram no ar questões a respeito da forma atual de funcionamento do clube e de qual seria a posição diante de mais uma decisão judicial de interdição.

O espaço segue aberto para os esclarecimentos dos citados.

*Foto em destaque: Rio Beach Club visto da ponte na entrada da Barra da Tijuca / Ruben Berta

**A reportagem foi atualizada às 17h50m de quinta (20) com respostas da prefeitura do Rio.

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