Pastor Everaldo e Wilson Witzel durante lançamento da candidatura em 2018

No auge da crise na Saúde, Pastor Everaldo foi um dos campeões de reuniões com Witzel

Enquanto a crise na Saúde do Estado do Rio avançava a passos largos em meio à pandemia do coronavírus, um personagem sem qualquer cargo no governo era uma das figuras mais frequentes nas reuniões realizadas no Palácio Laranjeiras, a residência oficial de Wilson Witzel: o presidente nacional do PSC, Pastor Everaldo.

Um levantamento feito pelo blog com base em registros de um livro de visitas solicitado pelo Ministério Público Federal (MPF) nas investigações da Operação Tris in Idem revela que, entre os dias 23 de abril e 26 de maio, Everaldo esteve com Witzel no Laranjeiras em nove ocasiões. No período, ele só perdeu para dois então secretários, responsáveis pela articulação política: André Moura, da Casa Civil, e Cleiton Rodrigues, de Governo.

Os dados reforçam o poder que Everaldo tinha no estado. Um dia emblemático foi 7 de maio, data em que o ex-subsecretário executivo de Saúde Gabriell Neves foi preso, acusado de desvios de recursos públicos na compra de respiradores.

Às 13h44m, poucas horas após a prisão, desembarcaram no Laranjeiras para se reunir com Witzel o então secretário de Saúde, Edmar Santos, o de Governo, Cleiton Rodrigues, e Pastor Everaldo. Em seguida, entre 15h20m e 16h10m, entraram outros membros do governo como André Moura, o então vice-governador Cláudio Castro, e o secretário de Polícia Civil, Marcus Vinícius Braga. O último registro de saída foi de Edmar Santos, às 18h28m. Não foi especificado o horário em que Pastor Everaldo deixou a residência oficial.

“Confiança em Deus”

Preso na manhã desta sexta (28) junto com dois filhos, Laércio e Filipe Pereira, Pastor Everaldo é apontado pelo MPF como o líder de um dos três grupos que teriam sido montados para o desvio de verbas públicas do estado.

Em sua delação, o ex-secretário de Saúde Edmar Santos disse que Witzel dava aval ao grupo do presidente do PSC e citou a suposta entrega de R$ 15 mil em espécie do então governador a Everaldo às vésperas da Operação Placebo, que realizou buscas no fim de maio, no Palácio Laranjeiras.

Em nota, a assessoria de imprensa do PSC afirmou que “o Pastor Everaldo aguarda acesso à íntegra do processo (da Operação Tris in Idem) para poder se defender das acusações mentirosas do delator e reafirma sua confiança na Justiça e em Deus”.

Já Witzel, também por nota, disse que “faz parte da rotina de um governador receber dirigentes partidários, parlamentares, secretários e outras pessoas que possam tratar de projetos de interesse público”. O governador afastado acrescentou ainda que “nunca governou guiado por influência de quem quer que seja, mas sempre debateu questões de governo com seus secretários e conselheiros políticos, como é praxe na política democrática”.

Ele reafirmou que “jamais pediu, recebeu ou repassou vantagem indevida e que provará a sua inocência”.

Mudança de secretários

O recorte pedido pelo MPF do livro de visitas do Palácio Laranjeiras coincide em boa parte com o período em que Witzel estava com a Covid-19 e despachou de sua residência oficial. Das nove ocasiões em que o Pastor Everaldo esteve lá, oito foram em dias da semana.

A exceção foi num sábado, 16 de maio, antevéspera de trocas na Secretaria de Saúde, em que o chefe do Executivo fluminense e o presidente do PSC estiveram reunidos por cerca de duas horas, no início da noite. Na segunda seguinte (18) – em que Everaldo também esteve à noite no Laranjeiras -, houve a mudança na pasta: assumiu Fernando Ferry, e Edmar Santos foi deslocado para o comando da Secretaria Extraordinária da Covid, cargo que exerceu por poucos dias.

A permanência mais longa de Everaldo no período pedido pelo MPF ocorreu na noite do dia 22 de maio, uma sexta-feira. O pastor e seu filho Filipe Pereira – que tinha cargo de assessor no governo estadual – ficaram por quase quatro horas, entre 20h08m e 23h40m na residência oficial de Witzel. Naquele dia, mais cedo, a revista Veja havia revelado uma citação ao então governador numa proposta de delação à PGR do empresário Arthur Soares, o “Rei Arthur”, que angariou contratos milionários no estado, principalmente na gestão de Sérgio Cabral.

Ex-juiz assíduo

Outro que não tinha nenhum cargo no estado, mas que esteve no Laranjeiras mais do que diversos secretários foi o ex-juiz federal Ricarlos Almagro Vitoriano Cunha, que deixou a magistratura no fim do ano passado para se dedicar à advocacia. Foram seis visitas, sendo cinco em dias de semana.

Uma das reuniões, no dia 14 de maio, uma quinta-feira, de mais de três horas de duração, foi realizada no mesmo horário em que uma pessoa identificada como Gotardo (que seria o ex-prefeito de Volta Redonda Gothardo Lopes Netto) também esteve no Laranjeiras.

De acordo com o MPF, o escritório da mulher de Witzel, Helena, recebeu, entre 2019 e 2020, R$ 280 mil do Hospital Jardim Amália, que pertence à família do ex-prefeito. Por sua vez, uma empresa localizada no mesmo endereço, a GLN Serviços Hospitalares e Assessoria, foi contemplada com recursos do governo estadual. Gothardo também foi preso na Operação Tris in Idem.

Outro advogado que esteve na residência oficial do governador, em dois domingos, foi Antônio Vanderler de Lima. Ele foi um dos doadores de campanha de Witzel e é pai de um advogado que representou a Organização Social Unir Saúde, que chegou a ter uma revogação de qualificação para atuar no estado cancelada pelo então governador.

Vanderler foi ouvido no mês passado numa comissão da Alerj que apura gastos da Saúde durante a pandemia, mas negou qualquer relação com a Unir e disse ser amigo de Witzel da época em que ele ainda era juiz federal.

Paulo Marinho

Outras visitas que chamam a atenção no contexto político foram as do empresário e suplente de senador Paulo Marinho, pré-candidato do PSDB à prefeitura do Rio.

Marinho esteve no Palácio Laranjeiras em 11 e 12 de maio, dois dias próximos à data em que concedeu uma entrevista para a Folha relatando que o senador Flávio Bolsonaro teria tomado conhecimento antecipado, através de um delegado da Polícia Federal, da Operação Furna da Onça.

Foi na deflagração da Furna da Onça que surgiu o relatório da movimentação financeira do ex-assessor de Flávio Fabrício Queiroz, dando origem à investigação da “rachadinha” no gabinete dele, referente à época em que era deputado na Alerj.

Tanto Paulo Marinho quanto Cleiton Rodrigues, ex-secretário de Governo que esteve em uma das reuniões, negaram que a denúncia sobre Flávio Bolsonaro tenha sido discutida. Eles afirmaram que houve conversas sobre comunicação digital e um possível apoio à pré-candidatura da ex-juíza Glória Heloiza, do PSC, para a prefeitura do Rio, o que não se concretizou.

No dia 17, data em que a entrevista foi publicada na Folha, Marinho esteve novamente no Laranjeiras com Witzel para pedir proteção policial, no que foi atendido. Atualmente, ele não conta mais com a segurança.

Uma figura inusitada da política que também esteve na residência oficial foi o ex-deputado Cabo Daciolo. Ele visitou o então governador em 13 de maio acompanhado do secretário estadual de Ambiente e Sustentabilidade, Altineu Côrtes.

A última página do livro de visitas é referente à transição do dia 25 para o dia 26 de maio, quando foi realizada a Operação Placebo, que contou com buscas no Palácio Laranjeiras. Estiveram lá, na noite do dia 25, o secretário da Casa Civil, André Moura, e o presidente da Alerj, André Ceciliano.

*Foto em destaque: Pastor Everaldo e Wilson Witzel durante lançamento da candidatura em 2018 / Divulgação / PSC

Um comentário

  1. Chegamos a um ponto que nem mesmo nos homens que se dizem de Deus podemos confiar inteiramente. Sempre há uma mácula nestas pessoas, que tem mais poder de enganar do que os mortais comuns. Tenho um blog https://jacksonrubem.com.br/ e tenho dificuldade de encontrar notícias boas para comentar, seja no meio político, seja no mundo em geral.

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