Em sua página no Instagram, a estudante universitária Catarina Brasil se define de forma bem sucinta: “veggie”. Ou seja, vegetariana. Seus hábitos alimentares, porém, não a impediram de, no dia 10 de janeiro de 2017, tornar-se sócia da Provenza Indústria e Comércio. A empresa apresenta seus produtos como perfeitos para os “amantes da boa carne”.
À época com 18 anos, Catarina dividiu a sociedade com Marcelle Braga Chadud e Wagner Provenzano de Paula. A parceria durou até o fim de 2018, quando as duas abandonaram a empreitada. Nesta terça (30), Marcelle e seu marido Flávio Salomão Chadud foram presos na Operação Catarata. Polícia Civil e Ministério Público estadual acusam o casal de liderar um esquema de fraudes na Fundação Leão XIII. Contratos de R$ 66 milhões do órgão estadual para serviços oftalmológicos com a empresa Servlog, de Flávio, estão sob suspeita.
Então, nesta quarta (31), o blog mostrou que a mesma Servlog também recebeu quase R$ 20 milhões da prefeitura do Rio entre os anos de 2012 e 2016. Os pagamentos vieram da Secretaria de Envelhecimento Saudável, pasta que foi dirigida pela ex-deputada federal Cristiane Brasil e seus apadrinhados políticos. E aí vem o detalhe: Catarina Brasil, ex-sócia de Marcelle Braga Chadud na empresa de carnes Provenza, é ninguém menos do que a filha da ex-parlamentar.

Vida de festas e viagens
Nas redes sociais, não há qualquer referência de que Catarina Brasil tenha efetivamente se dedicado à empresa de comércio de carnes. Até esta quarta, as fotos de seu Instagram estavam abertas. Demonstravam a vida agitada nos últimos anos da jovem. Com direito a festas e viagens ao exterior. Nesta quinta (1), ela tornou sua página privada.

Nos anos que antecederam o ingresso de Catarina Brasil na empresa de carnes, a Servlog, firma do marido de sua futura sócia, foi só vendo os números crescerem na Secretaria de Envelhecimento Saudável. Em 2012, foram cerca de R$ 1,8 milhão em pagamentos. Em 2016, o valor chegou a R$ 6,5 milhões. Em janeiro de 2017, então, a filha de Cristiane Brasil entrou na Provenza, de Marcelle Chadud.
Wagner Provenzano de Paula é o único dos três antigos sócios que continua tocando a companhia de comércio de carnes até hoje. Postagens antigas dele no Facebook mostram a parceria com Flávio Chadud, preso esta semana na Operação Catarata, nos negócios da Provenza.

Wagner também é casado desde o fim de 2016 com a irmã de Cristiane Brasil, Fabiana. Procurado pelo blog para comentar as sociedades na empresa, ele afirmou, por e-mail:
“A Provenza é uma pessoa jurídica de direito privado, regulada pelas leis empresariais e cíveis; seu objeto social é bem definido, e sua reputação no mercado é indiscutível; seus negócios são afeitos ao seu objeto social, e podem ser cabalmente demonstrados: a substância negocial é incontestável; como qualquer empresa, seu quadro social é mutável e sujeito as leis de mercado e contingências normais; não há, pois, qualquer conexão de nossas atividades com o objeto da reportagem, tampouco sabemos do que se trata”.
Ex-sócio em gabinete de deputado
No fim de 2018, com a saída de Catarina Brasil e Marcelle Chadud da Provenza, a empresa passou a ter como sócios Wagner Provenzano e Pedro Paulo Gomes Sequeira. Este último saiu em fevereiro deste ano para dar lugar a Heitor Jacinto Vieira.
Logo depois, em abril deste ano, Pedro Paulo Gomes Sequeira foi nomeado no gabinete do deputado Sérgio Fernandes na Alerj. Apadrinhado político do atual secretário estadual de Educação, Pedro Fernandes, o parlamentar foi indicado por seu mentor para presidir a Fundação Leão XIII em dois períodos, entre 2017 e 2018. Lembrando: foi este órgão estadual, que cuida de projetos sociais, o alvo da Operação Catarata, que culminou com a prisão do casal Chadud.
Apesar de não ter estado diretamente em sociedade com Marcelle Chadud na Provenza, Sequeira e sua mulher demonstraram nos últimos anos, em redes sociais, intimidade com o casal preso.
Em nota, a assessoria de imprensa de Sérgio Fernandes afirmou que “quando entrou no gabinete, foi constatado que Pedro Paulo não tinha nenhuma participação societária na mencionada empresa” e que “ele exerce a função de monitoramento de redes sociais do deputado”.
Atualmente, o casal Flávio e Marcelle Chadud é dono da Seleto Boutique de Carnes, loja que fica na Barra da Tijuca. O estabelecimento vinha comercializando produtos da Provenza.
Orgulho dos projetos com a Servlog
Ao menos até tempos atrás, tanto Pedro Fernandes quanto Cristiane Brasil demonstravam orgulho dos projetos realizados com a Servlog, empresa alvo da Operação Catarata. Num texto publicado no site do governo estadual quando Fernandes acabara de assumir a Secretaria de Assistência Social, em fevereiro de 2017, ele rasgou elogios ao programa Novo Olhar, tocado pela firma de Flávio Chadud:
“Essa é a minha primeira semana à frente da secretaria e é com muita alegria que participei hoje da primeira ação de 2017 do Novo Olhar. Apesar da crise, conseguimos retomar esse projeto, que é muito importante para a população ao oferece exames de vista e óculos gratuitos. Não estamos fazendo um favor a essas pessoas, já que os óculos e os exames são pagos com o dinheiro do contribuinte, com os impostos pagos por todos nós”.
Entrega até fora de sua área
Na reportagem, Pedro Fernandes se referia à distribuição de 600 óculos num bairro da Zona Oeste do Rio. O texto foi recentemente apagado do site do governo, mas o blog conseguiu recuperá-lo através do Web Archive.
Até quando era secretário municipal de Assistência Social do Rio, Fernandes esteve em outra cidade para entregar óculos do projeto Novo Olhar. Em janeiro de 2018, o jornal Hora H, da Baixada, registrou a ida dele a Queimados para uma ação do programa.
A assessoria de imprensa de Pedro Fernandes disse que, quando esteve à frente da pasta de Assistência Social do estado, “não tomou conhecimento de nenhuma irregularidade na Fundação Leão XIII”. “Pelo contrário, todas prestações de contas e fiscalizações davam conta de bons serviços prestados”, concluiu.
As suspeitas de fraudes foram levantadas pela Controladoria Geral do Estado (CGE) e se referem ao período de 2015 a 2018. A Polícia Civil e o MP então fizeram a operação que prendeu sete pessoas, entre elas os Chadud.
Programa no currículo
As investigações não abordaram os contratos da Servlog no município, mas o blog mostrou que a empresa recebeu quase R$ 20 milhões da Secretaria de Envelhecimento Saudável entre 2012 e 2016. Um dos contratos para o projeto Qualimóvel, de serviços médicos para idosos, teve a assinatura de Flávio Chadud e Cristiane Brasil.
E um dos presos pelas fraudes na Fundação Leão XIII foi Marcus Vinícius Azevedo da Silva, que é sócio de uma das empresas acusadas de conluio na licitação estadual com a Servlog. Na prefeitura, ele foi o pregoeiro da Secretaria de Envelhecimento Saudável num certame vencido pela empresa de Flávio Chadud. E ainda fiscalizou o contrato.
Cristiane Brasil, porém, colocou o projeto desenvolvido pela Servlog até em seu currículo na plataforma Lattes. Com direito a palestra no exterior:

Nesta sexta (2), após a publicação da reportagem, a ex-deputada encaminhou a seguinte nota:
“Quanto aos processos da prefeitura, afirma que os dados devem ser questionados ao órgão indicado.
Quanto à participação ou não de cidadãos sem atuação política em empresas privadas, é um direito garantido a todos.
Sem mais.”
*Foto em destaque: A então deputada Cristiane Brasil em reunião de bancada, em maio de 2017 / Divulgação / PTB / João Ricardo
E a secretaria estadual de envelhecimento saudável e qualidade de vida?
A empresa tb foi prestadora de serviços?
Pq era do PTB a pasta quando foi criada pelo então Governador Sérgio Cabral e tinha serviços semelhantes aos da secretaria municipal
Prisão é pouco para essa gente!