A virada de mesa à direita de Witzel em Conselho da Região Metropolitana

Uma decisão unilateral do governador Wilson Witzel pegou de surpresa representantes da sociedade civil que foram indicados no ano passado para compor o Conselho Consultivo da Região Metropolitana do Rio. Sem qualquer diálogo, entidades que já vinham se dedicando a estudos sobre o tema foram excluídas da reunião realizada no último dia 19, ficando de fora da sequência dos trabalhos. O colegiado tem como objetivo auxiliar no planejamento integrado entre a capital e 20 municípios do seu entorno.

As movimentações em torno da criação de diretrizes para a Região Metropolitana do Rio começaram após a publicação de um decreto em 2014, mas no ano passado é que ganharam mais corpo. Uma conferência realizada em Niterói com 124 delegados escolheu os indicados da sociedade civil para o colegiado de apoio. E, na sequência, foi aprovada uma lei complementar na Alerj com uma série de normas relacionadas ao tema.

Em junho passado, foi realizada uma reunião com a presença de representantes do próprio governo Witzel, que elegeu como presidente do Conselho Consultivo, Henrique Silveira, coordenador executivo da ONG Casa Fluminense. Juarez Fialho, secretário estadual das Cidades, foi derrotado. Agora em setembro então, o governador passou uma borracha em tudo e colocou os representantes que quis.

Sai Casa Fluminense, entra Instituto Liberal

Além da Casa Fluminense, entidade criada em 2013 que tem exatamente o desenvolvimento sustentável da Região Metropolitana como um de seus focos, também foram excluídos do conselho o Iser (Instituto de Estudos da Religião) e a Fase. As duas ONGs têm um longo histórico de trabalho no Terceiro Setor no Estado do Rio.

No lugar dessas entidades, surgiram como indicações de Witzel representantes de Direita. É o caso de Lucas Berlanza, diretor-presidente do Instituto Liberal, “o primeiro think tank liberal do Brasil”. O jornalista ainda é editor dos sites Sentinela Lacerdista e Boletim da Liberdade. Também foi autor do livro “Guia Bibliográfico da Nova Direita”, que tem Olavo de Carvalho entre os autores sugeridos.

Em postagem recente no Facebook, ele se mostra alinhado com a política do governo Witzel:

Discípulo de Olavo de Carvalho

Também foi colocado no conselho pelo governador Rafael Hollanda, identificado na ata da reunião realizada este mês como presidente da Casa dos Colibris. Em sua página no Facebook, a Casa se define como um “grupo de estudos dedicado à compreensão de diversos autores pela perspectiva liberal”.

Já Hollanda diz no Facebook ser colunista do Instituto Liberal – dirigido por Lucas Berlanza -, e ter estudado na instituição de ensino “Seminário de Filosofia Olavo de Carvalho”. Pela lei que estabeleceu o Conselho Consultivo da Região Metropolitana, no ano passado, não poderia haver dois representantes da sociedade civil pertencentes à mesma entidade no colegiado.

O Instituto Liberal é ligado ao professor universitário Bernardo Santoro, um dos responsáveis pelo programa de governo de Witzel. Atualmente, ele tem um cargo de assessor especial no estado e também uma cadeira no Conselho Consultivo da Região Metropolitana.

Millenium com cadeira garantida

Outra indicação de Witzel foi a do diretor de teatro, TV e cinema Moacyr Góes. membro do Instituto Millenium. A entidade teve como um de seus fundadores o atual ministro da Economia, Paulo Guedes. Na lista de especialistas do instituto consta o nome do assessor de Witzel Bernardo Santoro. Outro colaborador é o engenheiro Roberto Motta, que também possui cargo de assessor do governo e uma cadeira no Conselho Consultivo da Região Metropolitana.

Como representantes da juventude, foram nomeados Letícia Arsênio, coordenadora do Estudantes pela Liberdade, e Wesley Barreto, presidente do Fórum de Gestores da Juventude. Letícia é assessora parlamentar e influenciadora digital, e Wesley já foi candidato a vereador em Petrópolis pelo MDB e é ligado ao deputado estadual Gustavo Tutuca.

Ficaram de fora da nova composição, por sua vez, grupos como as federações de associações de moradores de Maricá, Guapimirim e Japeri. No site oficial da Câmara Metropolitana, de responsabilidade do governo estadual, há apenas a ata da reunião deste mês. A de junho, com outros representantes, foi desprezada.

“Perfil autoritário”

A principal reação à canetada de Witzel veio da Casa Fluminense. A ONG publicou um texto em seu site criticando duramente a postura do governador do Rio.

“A decisão do governador reforça o seu perfil autoritário e sem a capacidade de respeitar processos de participação social e organização autônoma da sociedade civil. Infelizmente, esse não é um fato isolado. Ele faz parte do contexto mais amplo de uma política autoritária e violenta no governo estadual e federal, que esvazia os conselhos de participação social, ameaça organizações da sociedade civil e conduz uma política de segurança homicida, com o Estado violando direitos de comunidades pobres”, diz um trecho do desagravo.

O coordenador da ONG Henrique Silveira soube que não estaria mais na reunião que mudou os representantes da sociedade civil uma semana antes do encontro, por e-mail. Cobrou, através de um ofício, da Procuradoria Geral do Estado (PGE) os motivos da exclusão, mas não teve retorno.

Na letra da lei

Procurado pelo blog, o governo informou que baseou a decisão de anular os atos da reunião de junho num parecer elaborado pela própria PGE. Os atos anteriores não tiveram validade, segundo a nota, “pois os participantes da reunião não haviam sido nomeados pelo presidente do Conselho Deliberativo”.

Pela lei de 2018, a governança metropolitana tem um órgão executivo e dois conselhos: o consultivo e o deliberativo. Este último é presidido pelo governador, que efetivamente tem o poder de nomeação para os mandatos de quatro anos do colegiado consultivo. Witzel usou então a sua caneta para trocar os representantes da sociedade civil.

Às vésperas de ano eleitoral, os planos para a Região Metropolitana podem influenciar na política de municípios do entorno da capital. O novo presidente do Conselho Consultivo ainda não foi escolhido.

*Foto em destaque: Governador Wilson Witzel em fórum da Revista Exame / Divulgação / Governo do Estado

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