Cedae: diretor financeiro foi condenado pela CVM em escândalo do Banco Econômico

Cedae: diretor financeiro foi condenado pela CVM em escândalo do Banco Econômico

Diretor Financeiro e de Relações com Investidores da Cedae desde janeiro do ano passado, o economista José Bandeira de Mello Júnior tem o seu passado marcado pelo envolvimento num dos maiores escândalos da História recente do país: a quebra do Banco Econômico. Em 1995, a instituição sofreu intervenção do Banco Central, em meio a fraudes contábeis. A liquidação extrajudicial segue em andamento, ainda com bilhões de reais a serem devolvidos para os credores.

Ex-vice-presidente financeiro do Econômico, José Bandeira de Mello Júnior foi condenado em 2004 pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) à pena de três anos de “inabilitação para o exercício de cargo de administrador de companhia aberta”. Em 2009, o Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN), do Ministério da Fazenda, confirmou a sanção. A decisão, porém, falava em sete anos de inabilitação.

No atual cargo de diretor Financeiro e de Relações com Investidores da Cedae, Bandeira de Mello pode ter papel importante no processo de privatização da empresa, defendido abertamente pelo governador Wilson Witzel. É ele quem assina junto com o presidente da estatal, Hélio Cabral, comunicados ao mercado. Em dezembro passado, por exemplo, foi informada pela dupla a realização de um evento do BNDES para “a redefinição do escopo de atuação da companhia”.

Em nota (íntegra no fim do texto), a Cedae defendeu a legalidade da escolha do diretor. Ele foi eleito pelo Conselho de Administração em 25 de janeiro de 2019, menos de um mês depois de Witzel assumir o comando do Executivo fluminense. O salário de Bandeira de Mello é de R$ 27,8 mil mensais.

Banqueiro impune

O inquérito aberto pela CVM relativo ao Banco Econômico constatou uma série de irregularidades na gestão da empresa como simulação de compra e venda de imóveis, empréstimos para empresas ligadas com sede no exterior, maquiagem de balancetes e apropriação ou desvio de recursos em proveito próprio ou alheio.

Em 2004, a comissão também condenou o banqueiro Ângelo Calmon de Sá, que presidiu a empresa durante a época do escândalo, à pena de inabilitação para cargos de direção, mas por 20 anos. O CRSFN ratificou a decisão em 2009. O caso de Calmon de Sá, porém, é tido como um exemplo de impunidade. Condenações em processos judiciais a que ele responde, inclusive em segunda instância, não foram suficientes para colocá-lo na cadeia. Ele está com 84 anos e dificilmente será preso.

As estimativas mais recentes dão conta de que o rombo deixado pelo Banco Econômico passe da casa dos R$ 16 bilhões. No site da instituição, a resposta para a pergunta dos credores “quando vou receber meu dinheiro?” define bem como o escândalo ainda tem reflexos até hoje: “Ainda não se encontra definida data para pagamento dos créditos”.

Empréstimo misterioso

Segundo o relatório do inquérito da CVM, José Bandeira de Mello Júnior foi condenado no escândalo do Banco Econômico por infringir os artigos 153 e 154 da lei 6.404/76, que trata das regras das sociedades por ações.

Os artigos falam da obrigação do “cuidado e diligência que todo homem ativo e probo costuma empregar na administração dos seus próprios negócios” e de exercer a função “para lograr os fins e no interesse da companhia, satisfeitas as exigências do bem público e da função social da empresa”.

O caso específico que envolveu Bandeira de Mello foi uma operação de empréstimo de US$ 10 milhões à firma individual João Luiz Biato. O dinheiro seria usado para a compra de um terreno em Paraty (RJ) onde seria construída uma marina, que nunca saiu do papel.

“O próprio terreno foi dado em garantia hipotecária em 1º grau do empréstimo obtido, não sendo exigido qualquer laudo de avaliação do imóvel ou qualquer projeto elaborado por técnicos ou por firma de engenharia, relativo à construção da marina, sendo que a firma em questão foi aberta apenas dois meses antes do negócio e tinha capital social equivalente a somente US$287,70”, diz o relatório.

“Os recursos não foram aplicados na sua concepção inicial e seu paradeiro é desconhecido”.

Marina que nunca existiu

A marina nunca foi construída e o relatório de inquérito da CVM apontou para uma triangulação que envolveu um depósito num banco paraguaio.

“Um cheque administrativo, de valor equivalente à primeira parcela…, pouco mais de US$ 5 milhões, foi depositado no mesmo dia em que foi sacado, 18.09.92, junto ao Banco Nacional S.A – agência Foz do Iguaçu-PR, a favor do Interbanco S.A Casa Central, instituição estrangeira, com sede em Assunção, no Paraguai”.

Em sua defesa, segundo o que consta no relatório da CVM, José Bandeira de Mello Júnior alegou que, entre todas as operações analisadas pela comissão, apenas esta motivou as imputações a ele.

A defesa também alegou que ele era um mero empregado do Banco Econômico e que a criação de uma reserva ecológica na área do terreno acabou inviabilizando a construção da marina no local.

Os argumentos, porém, não convenceram a CVM.

“Assim, mesmo que a desapropriação não tivesse ocorrido e o empréstimo fosse devidamente pago, diante das patentes e manifestas irregularidades presentes na realização do contrato de mútuo em exame, a falta cometida pelos acusados (José Bandeira de Mello Júnior e Vital de Freitas Santos Souza Filho) já estaria devidamente caracterizada no exato momento em que os defendentes deixaram de tomar as precauções necessárias para que se garantisse o retorno dos recursos emprestados”.

Gestor em Niterói

Apesar da condenação pela CVM, José Bandeira de Mello Júnior ainda atuou nos anos 2000 na Companhia de Limpeza Urbana de Niterói (Clin). Ele também passou pela presidência da Fundação Municipal de Educação de Niterói.

Atualmente, o diretor da Cedae é dono de uma de empresa de consultoria em gestão empresarial, com o nome fantasia de Horto Consultoria. Segundo o site da Receita Federal, ele também é sócio da TNO Participações LTDA. Nesta empresa, ele tem a companhia de dois ex-sócios do Parque Terra Encantada, que fechou as portas em 2010, na Barra da Tijuca: Rodney Kien Hwa Oei e Danilo Rangel Rocha.

O que diz a Cedae

O blog procurou a Cedae com questões a respeito do passado de seu diretor financeiro, mas, com dois dias de atraso, a assessoria de imprensa da empresa afirmou que a reportagem deveria “entrar em contato com o próprio, pois (as perguntas) não são relacionadas à Companhia”. O blog tentou contato sem sucesso com José Bandeira de Mello Júnior, mas o espaço segue aberto para esclarecimentos.

Sobre a nomeação do diretor, a empresa disse que “é necessário que o candidato seja avaliado pelo Comitê de Elegibilidade da Companhia”. “José Bandeira atendeu todos os requisitos da Lei 13.303/16 (que rege as empresas públicas) e Decreto Estadual 46.188/17 (que regulamenta o tema) e teve seu nome aprovado”.

*Foto em destaque: Fachada da sede da Cedae / Tomaz Silva / Agência Brasil

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