Sem qualquer tipo de seleção pública ou transparência, o Estado do Rio assinou, no início deste mês, um contrato de R$ 835,7 milhões com a Organização Social Instituto de Atenção Básica e Avançada à Saúde (Iabas) para a implementação de 1.400 leitos em sete hospitais de campanha. As unidades atenderão a pacientes com a Covid-19. O valor será repassado ao longo dos próximos seis meses.
Mais uma vez, o processo de contratação foi conduzido pelo subsecretário executivo de Saúde, o advogado Gabriell Neves. Conforme revelou o blog, ele é acusado na Justiça de dar um golpe de mais de R$ 200 mil numa cliente idosa, que ficou sem o dinheiro de uma indenização conseguida após um processo que durou 12 anos.
Apesar do alto valor do contrato, não houve qualquer publicação em Diário Oficial para que OSs pudessem se apresentar ao menos para um processo de seleção emergencial. As sete unidades – Maracanã, Parque Olímpico, Duque de Caxias, São Gonçalo, Campos, Casimiro de Abreu e Nova Iguaçu – foram todas concedidas ao Iabas.

No Sistema Eletrônico de Informações (SEI) do governo estadual, consta que houve apenas a proposta desta única OS para o serviço. Ainda assim, este documento está com acesso restrito. Ou seja, não pode ser consultado pelo público externo. E mais: o contrato feito pela Secretaria de Saúde está cortado. Não é possível ver o trecho onde estariam as assinaturas de Gabriell Neves e do secretário de Saúde, Edmar Santos.
No dia 3 de abril, já foi emitida uma nota de empenho – primeira fase no processo de pagamento – para o Iabas de R$ 83,5 milhões, valor acima dos R$ 69,6 milhões previstos no contrato para cada parcela.
As marcações na imagem abaixo, nos prazos e valores, estão no documento original, não foram grifadas pelo blog.

A existência do contrato também foi noticiada nesta quarta (8) pela Folha. O Iabas já vem atuando em São Paulo.
Dobro do preço
Não bastassem a falta de transparência e de um processo público de seleção, os hospitais de campanha do governo estadual irão custar, proporcionalmente, quase o dobro, por exemplo, do que a unidade que está sendo montada pela prefeitura do Rio.
Ao contrário do estado, o município decidiu que não uma Organização Social, mas a Empresa Pública de Saúde (RioSaúde) ficará responsável pelo hospital que está sendo montado no Riocentro. O contrato é de R$ 151,2 milhões por seis meses para a implementação de 500 leitos. Ou seja, o valor mensal ficou em R$ 25,2 milhões.

No caso do estado, o contrato fala num total mensal de R$ 139,2 milhões por 1.400 leitos.
Para efeito de comparação, a gestão Witzel pagará por mês o equivalente a pouco mais de R$ 9,9 milhões por cada 100 leitos. A gestão Crivella pagará cerca de R$ 5 milhões mensais por cada 100 leitos. Ou seja, o estado vai desembolsar proporcionalmente quase o dobro do município.
Quantidade de leitos muda
Há um outro ponto. No processo feito pela Secretaria estadual de Saúde, o primeiro documento, chamado de termo de referência, que especifica as quantidades a serem contratadas, falava em mil leitos.
Depois, porém, o contrato assinado com o Iabas aumentou a quantidade para 1.400 leitos. Foram incluídas unidades em São Gonçalo e Nova Iguaçu, que não constavam do projeto original.
Nesta quarta (8), já começou o processo para seleção de outras empresas terceirizadas que irão prestar serviços administrativos e atividades operacionais dentro da gestão do Iabas nos hospitais de campanha. Quatro empresas se apresentaram: Practice, Corporate Events, Épico e Clube de Produção. As propostas não estão disponíveis para consulta pública.
Apesar de ter optado por uma Organização Social, o estado tem em sua estrutura a Fundação Saúde, modelo parecido com a RioSaúde, da prefeitura do Rio.
O município veio nos últimos meses tirando as OSs da gestão das unidades e trocando pela RioSaúde. O próprio Iabas foi descredenciado no meio do ano passado. Já o estado vem tirando a administração de hospitais da Fundação Saúde, como fez recentemente com o Anchieta e o Zilda Arns.
Justificativa: duas frases
No termo de referência, assinado pelo subsecretário executivo de Saúde, Gabriell Neves, a justificativa para a contratação de uma Organização Social para implementar os hospitais de campanha tem apenas duas frases. E com erros de português.
“É de conhecimento a pandemia do virus COVID-19, acarretando grande demanda nas Unidades Hospitalares, por tanto, necessitamos a contratação de Pessoa Jurídica de Direito Privado para prestação de serviços.. O Hospital de Campanha é a Unidade Hospitalar Móvel a ser utilizada em enchentes, epidemias e pandemias, como auxiliar as Unidades Hospitalares”.
Sim, foi exatamente desta forma que foi embasado um gasto de R$ 835,7 milhões sem nenhum processo seletivo.
Decreto em março
A abertura para este tipo de aberração pode ter tido origem num decreto publicado pelo governador Wilson Witzel em 25 de março, que criou novas normas de contratação durante a pandemia.
Há o seguinte artigo que trata das OSs:
“Fica autorizada a celebração de contrato de gestão com entidade qualificada como organização social de forma simplificada, cujos prazos poderão ser reduzidos, mediante justificativa detalhada de sua necessidade, observados os princípios contidos no caput do art. 37 da CRFB/88“.
Na prática, a “justificativa detalhada” teve duas frases com erros de português, mas o contrato foi assinado mesmo assim.
Para o professor de Direito Administrativo da PUC-Rio Manoel Peixinho, a falta de transparência no processo compromete a contratação:
“A ausência de transparência nos procedimentos administrativos de compra de produtos ou de contratação de serviços viola os princípios constitucionais da publicidade, moralidade e competitividade, estão os agentes públicos responsáveis sujeitos à responsabilização administrativa, cível e penal se forem comprovadas práticas de atos ilegais que resultem em dano ao erário”.
Procurada, a assessoria da Secretaria estadual de Saúde não se manifestou sobre a assinatura do contrato com o Iabas. O espaço segue aberto.
*Foto em destaque: Governador do Rio, Wilson Witzel, e secretário de Saúde, Edmar Santos, no dia do anúncio da implementação dos hospitais de campanha
As pessoas não entendem, mas mesmo assim eu vou declarar minha opinião. Tudo isso acontece no Brasil a partir da conivência do poder judiciário. No momento que a justiça é tendenciosa, não pune os crimes com o devido rigor cria um salvo conduto para esse tipo de crimes ao erário. Recentemente a Ecovias declara que seus 12 contratos foram fraudados e distribuído propinas para garantir a fraude. O que aconteceu !? – Nada, ou melhor fez um acordo com a justiça para devolver o furto em obras futuras e permanecer com o contrato ativo. Esses casos se repetem as centenas, e em alguns que por descuido prendam os criminosos, poucos dias depois soltam…
Circo de horrores!
Agora entendi o porquê da falta de medicamentos no hospital de campanha
https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2020/05/23/medica-desiste-de-trabalhar-no-hospital-de-campanha-do-maracana-apos-um-plantao-aquilo-e-um-cti-de-fachada.ghtml
https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2020/05/22/ala-do-hospital-de-campanha-do-maracana-e-inaugurada-mas-funcionarios-denunciam-falta-de-medicamentos.ghtml