O principal articulador do projeto dos hospitais de campanha para pacientes com coronavírus no Estado do Rio foi um advogado condenado por tráfico de influência e exploração de prestígio. Trata-se de Roberto Bertholdo, acusado de ter solicitado dinheiro do ex-deputado paranaense Tony Garcia, no inicio dos anos 2000, para que um ministro aposentado do STJ atuasse em favor do ex-parlamentar num processo criminal.
A participação de Bertholdo como um personagem-chave na implementação dos hospitais foi confirmada num documento enviado no dia 15 de maio pela Organização Social Instituto de Atenção Básica e Avançada à Saúde (Iabas) à Secretaria estadual de Saúde.
A OS, que conquistou, sem processo seletivo, o contrato atualmente em R$ 770 milhões, descreve da seguinte forma a atuação do escritório Roberto Berholdo Sociedade Individual de Advocacia:
“Consultoria, liderança e representação no que diz respeito ao projeto de construção de hospitais de campanha e demais contratações realizadas durante o estado de emergência de saúde pública decorrente do coronavírus, compreendendo a seguinte atuação:
Coordenação e organização do projeto de construção de hospitais de campanha e demais contratações correlatas; representação do Iabas em reuniões sobre o tema; falar em nome do Iabas em contatos – inclusive informais – com os fornecedores contratados em virtude do projeto; coordenação e organização das contratações e demandas durante toda a execução do projeto”.
Preso por 11 meses
Ou seja, o documento da própria entidade deixa pouca margem de dúvida em relação ao advogado ter sido o grande articulador dos hospitais de campanha no estado que, apesar do avanço da pandemia, estão atrasados.
Um outro escritório, Bonini Guedes Advocacia, foi descrito como sendo o responsável por toda a parte de assessoria jurídica do Iabas.
Bertholdo chegou a ficar preso por 11 meses, entre dezembro de 2005 e novembro de 2006, mas conseguiu decisão para responder ao processo em liberdade. Em 2016, porém, o STJ confirmou pena de 4 anos e 8 meses, em regime aberto.
A partir daí, foi iniciado um processo de execução desta pena. Em 24 de abril do ano passado, o advogado passou a usar tornozeleira eletrônica. O monitoramento durou até o dia 8 de novembro, quando Bertholdo se valeu de decisão do STF, que o permitiu estar em liberdade enquanto não fossem julgados todos os recursos possíveis no processo.
Desde então, ele vem tentando, sem sucesso, emplacar recursos no próprio STF para extinguir a pena. O último, do dia 12 de maio, foi um agravo regimental no recurso extraordinário com agravo, negado pela Segunda Turma do Supremo.
De tornozeleira no Fasano
A atuação de Bertholdo para o Iabas nos hospitais de campanha não foi a primeira relação entre o advogado e a Organização Social. No dia 1º de julho do ano passado, ele já havia assinado um contrato de um ano com a entidade para assessoria jurídica na gestão do Hospital estadual Adão Pereira Nunes, em Duque de Caxias. Somente por este serviço, vinha recebendo R$ 46 mil mensais.
Como ainda vinha sendo monitorado pela Justiça Federal do Paraná através de tornozeleira eletrônica, o advogado teve que comunicar viagens a trabalho que fez para atuar para o Iabas.
Entre os dias 24 e 25 de outubro do ano passado, por exemplo, foi registrada uma vinda ao Rio de Janeiro. Bertholdo ficou hospedado no Hotel Fasano, na Avenida Vieira Souto, enquanto esteve na cidade para realizar os serviços para a Organização Social.
Durante o período em que era monitorado, o advogado também teria atuado para uma outra OS, o Instituto Sócrates Guanaes.
Grampo em Moro
Além do processo em que foi condenado por tráfico de influência e exploração de prestígio, Bertholdo ainda respondeu a outras duas ações penais na Justiça Federal de Curitiba, que tiveram as penas extintas. Em uma delas, a acusação foi de ter grampeado o então juiz Sérgio Moro.
“A propósito vale o registro de que valendo-se do expediente do abuso do direito de defesa, com o manejo de sucessivos e infindáveis recursos, o réu já alcançou a extinção de sua punibilidade em duas outras ações penais que tiveram curso neste juízo, nas quais foi igualmente condenado em 1ª e 2ª instâncias, respectivamente, pelos crimes do art. 10 da Lei nº 9.296/1996 (por ter grampeado os terminais telefônicos de uso do juiz federal Sergio Fernando Moro) e, uma vez mais, pelo crime de exploração de prestígio (art. 357 do CP), com o que livrou-se de penas que somadas redundariam em 05 anos e 04 meses de reclusão”, relata a juíza Gabriela Hardt num despacho de 2016 na ação em que o advogado foi condenado.
*Foto em destaque: Hospital de campanha do Maracanã / Divulgação