Para tentar resolver um problema não solucionado pelas empresas de ônibus, a prefeitura do Rio está usando recursos dos cofres públicos para o aluguel de veículos das próprias empresas. É esse o resumo de uma das medidas que foram tomadas até agora pelo município, numa intervenção no sistema do BRT ainda cercada de dúvidas.
Segundo a Secretaria municipal de Transportes (SMTR), já foram gastos, em um mês e meio, R$ 581 mil com a locação de ônibus para aumentar a frota em circulação no Corredor Transoeste nos momentos de pico.
Num primeiro momento, as empresas selecionadas foram a Expresso Recreio, a Redentor, a Auto Viação Tijuca, a Caprichosa e a Três Amigos. As quatro últimas são sócias da própria companhia BRT S.A, exatamente a que está sob intervenção devido aos maus serviços prestados. A primeira compõe o Consórcio Santa Cruz, um dos quatro que atuam na cidade desde 2010.
Em nota (íntegra no fim do texto), a SMTR alegou que a contratação se deu “pelo menor valor unitário após procedimento de cotação de preços, tendo sido consultadas 12 empresas de três diferentes estados”.
Atualmente, este reforço na frota – chamado de “diretão” – estaria sendo operado por um consórcio chamado Via Rock, formado pelas empresas Gire, Pavunense, Faol, Ideal, Braso Lisboa e Palmares. As três últimas pertencem ao Rio Ônibus, o sindicato que reúne as companhias que atuam na capital.
Sem transparência
Apesar da promessa de que haveria transparência, a realidade, por enquanto, é que ainda existe uma grande nuvem em torno da intervenção no BRT, prevista para durar seis meses. O blog enviou dez perguntas para a Secretaria de Transportes, mas muitas delas ficaram sem respostas.
Uma das principais incógnitas é a forma com que os recursos que estão sendo investidos na companhia retornariam aos cofres públicos. A prefeitura inclusive sequer informou à reportagem o total retirado até agora do Tesouro para reforçar as finanças da empresa.
Houve até o momento pouco mais de R$ 9 milhões em transferências para o Fundo de Mobilidade Urbana, que tem sido utilizado para aportar dinheiro na intervenção. Com a aprovação na Câmara no mês passado de um projeto de lei do Executivo, há possibilidade de os valores chegarem a R$ 130 milhões.
Em entrevista coletiva no mês passado, o prefeito Eduardo Paes afirmou que haveria “garantias bancárias” para que os recursos fossem futuramente devolvidos. O blog questionou à SMTR que garantias seriam essas, mas não houve resposta.
A BRT S.A é uma companhia com capital social de apenas R$ 100 mil, que tem oito empresas de ônibus que operam na cidade como acionistas.
R$ 49 mil para diretor
No dia 28 de abril, Paes publicou um decreto estabelecendo algumas regras de fiscalização dos recursos usados na empresa, cujo controle ficará com a Controladoria Geral do Município e com a própria interventora, Cláudia Secin. Há previsão de transparência através de relatórios bimestrais, mas não é possível saber exatamente que nível de detalhamento será disponibilizado para consulta pública.
Na mesma data, o Conselho do Fundo de Mobilidade Urbana deu um cheque em branco para que a prefeitura banque a folha de pagamento e o combustível da BRT S.A nos próximos meses. O conselho é formado pela secretária de Transportes, Maina Celidônio, a de Conservação, Anna Laura Secco, pelo procurador-geral do Município, Daniel Bucar Cervásio, e pela presidente da CET-Rio, Simone Costa Rodrigues da Silva.
E, apesar de a interventora Cláudia Secin ter criticado, em uma apresentação da intervenção feita à imprensa no mês passado, a gestão dos recursos da companhia, a prefeitura tem mantido nos quadros da BRT S.A o antigo diretor financeiro, Nuno Manuel Cidadão Filipe.
De acordo com uma folha de pagamento a que o blog teve acesso, seu salário seria de R$ 49,5 mil por mês.

A SMTR alegou que Nuno “foi o único da alta direção que foi mantido, por ser estatutário da companhia e responder perante os órgãos federais tributários, incluindo o passivo total da mesma”. A pasta também afirmou que já reduziu a folha em 10%.
Combustível
Além da folha de pagamento, a prefeitura também tem bancado e continuará nos próximos meses a pagar pelo combustível dos ônibus da BRT S.A com recursos do Tesouro.
Isso apesar de, em outubro do ano passado, a empresa ter aprovado, em ata de assembleia extraordinária, a contratação de R$ 19 milhões para a aquisição de 117 milhões de litros de combustível. Não fica claro se todo esse valor já teria sido executado.
Paralelamente, a Secretaria municipal de Transportes disse que vem investindo o dinheiro da bilhetagem – até agora R$ 1,650 milhão – na recuperação da frota, com gastos em peças, pneus e lubrificantes. O blog não localizou dados públicos sobre que empresas estariam sendo contratadas e em que condições.
Perguntas
Abaixo, serão reproduzidas as dez perguntas enviadas pela reportagem à SMTR, com destaque em negrito para as que não foram respondidas. E, em seguida, a nota na íntegra da pasta.
Já o Rio Ônibus enviou nota afirmando que a entidade, “assim como os consórcios, não integra o contrato de operação dos ‘diretões'”.
- Em primeiro lugar, queria confirmar exatamente quanto já foi investido até agora na intervenção do BRT. Pelo que foi publicado em Diário Oficial, houve três transferências do tesouro para o Fundo de Mobilidade Urbana, em valores de R$ 5 milhões, R$ 1,056 milhão e R$ 3,035 milhões.
- Esses valores foram apenas para folha de pagamento e combustível? Se sim, quanto para cada uma das rubricas?
- Não houve investimentos em recuperação da frota, compra de peças, como foi anunciado em coletiva pela interventora? Se houve, de quanto foi? Foi dinheiro da prefeitura?
- Tive acesso a uma tabela de um processo administrativo que mostra que consta na folha de pagamento do BRT o salário do diretor financeiro da empresa, de cerca de R$ 49 mil. Por que a prefeitura optou por manter o dirigente com tal salário, levando em conta que foram detectados exatamente problemas de gestão financeira?
- A interventora disse em coletiva no mês passado que a folha salarial do BRT era um problema, com quadro extremamente inchado. Quantos postos foram cortados, que cargos e que economia foi gerada?
- De que forma o dinheiro que está sendo investido na intervenção retornará aos cofres da prefeitura? Em que prazo, com que índice de correção?
- Que garantias a prefeitura tem de que o dinheiro retornará já que a BRT S.A é uma empresa com capital social de apenas R$ 100 mil?
- No mesmo processo administrativo que vi, há uma afirmação da interventora de que o déficit na BRT S.A continua apesar das medidas já tomadas, o que demandou o aporte com folha e combustível. De quanto exatamente foi o déficit detectado até agora?
- Quando a prefeitura irá dar transparência às contas do BRT (o site transparência da mobilidade está fora do ar) e que tipo de informações ficarão disponíveis com fácil acesso público?
- Por fim, uma outra tabela a que tive acesso, com a previsão orçamentária do BRT para os próximos meses, mostra uma previsão de investimento somente em abril de mais de R$ 2 milhões com o aluguel de ônibus “diretões”. Que valor exatamente já foi gasto e de quem foram alugados esses veículos?
Outro lado
A seguir, a íntegra da nota da SMTR:
“Em resposta aos questionamentos, a equipe de intervenção do BRT Rio S.A., em conjunto com a Secretaria Municipal de Transportes, informa que a economia mensal da atual gestão chega a R$ 440 mil, resultado da rescisão e/ou renegociação de 19 contratos. Outros estão sendo analisados, com vistas à substituição por condições mais vantajosas. E até o presente, já houve uma redução inicial de 10% na folha de pagamento do BRT Rio S.A.
Desde o início da intervenção foi gasto o montante total de R$ 1,650 milhão em peças, pneus e lubrificantes, destinados à recuperação da frota de articulados. Este valor saiu das receitas do BRT, provenientes da bilhetagem da empresa.
Uma equipe de técnicos da prefeitura está auditando toda a documentação da empresa, incluindo balancetes e relações contratuais até então firmadas pela gestão anterior do BRT Rio, bem como da respectiva folha de pagamento. Este trabalho ainda se encontra em andamento.
O referido diretor administrativo financeiro foi o único da alta direção que foi mantido, por ser estatutário da companhia e responder perante os órgãos federais tributários, incluindo o passivo total da mesma. Além disso, o mesmo detém conhecimento sobre o funcionamento e a memória da empresa e segue prestando todas as informações demandadas pela equipe de intervenção e auditores da Prefeitura.
Até agora, foram gastos pela prefeitura do Rio o montante de R$ 581 mil referentes à locação de ônibus para os serviços eventuais, incluindo motoristas, combustível, manutenção e garagem.
As empresas foram contratadas pelo menor valor unitário após procedimento de cotação de preços, tendo sido consultadas 12 empresas de três diferentes estados. Na primeira fase do “Diretão” (de 23/03 a 09/04) os ônibus foram locados das empresas Redentor, Auto Viação Tijuca, Caprichosa e Três Amigos. Já na segunda fase, iniciada em 12/04, foi contratada a empresa Expresso Recreio”.
*Foto em destaque: Ônibus alugados pela prefeitura para reforçar o sistema do BRT / Divulgação / Prefeitura do Rio
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