Citada no ano passado num depoimento do ex-governador Sérgio Cabral como um “biombo” para ilegalidades, a FGV Projetos caminha a passos largos para conquistar novos contratos, agora na gestão de Wilson Witzel. Em plena pandemia do coronavírus, o braço da Fundação Getúlio Vargas está prestes a assinar dois convênios com a Secretaria de Saúde, no valor total de R$ 7,45 milhões.
O processo está sendo tocado pelo subsecretário executivo de Saúde, Gabriell Neves e está em fase final. Já foram elaboradas as minutas dos contratos, faltando apenas pareceres internos para a assinatura.
O primeiro convênio será para “análises estratégicas sobre a pandemia do coronavírus a partir das mídias digitais”. O valor estipulado foi de R$ 950 mil por seis meses. Também está sendo articulada uma parceria para “monitoramento, avaliação e controle” dos contratos entre o governo e Organizações Sociais para a gestão de unidades de Saúde. O custo: R$ 6,5 milhões por um ano.
Não houve processo licitatório e a demanda partiu diretamente de Gabriell Neves para a FGV Projetos.
“Cenários políticos”
No dia 20 de março, o subsecretário de Saúde enviou um ofício à fundação solicitando “em caráter de emergência” uma proposta para o serviço de “monitoramento, em tempo real, da percepção social e repercussão de iniciativas governamentais” durante o enfrentamento à pandemia do coronavírus.
No dia 23, a FGV Projetos já enviou uma proposta de 14 páginas para a realização do serviço. Entre as ações previstas, estão a análise de mídias digitais, como Twitter, Facebook e WhatsApp, “com o objetivo de construção de cenários políticos e de responder questões relativas à pandemia de Covid-19 e seus impactos na conjuntura política, econômica e social, bem como a percepção por parte da sociedade”.
Ou seja, um dos focos do projeto, de R$ 950 mil, é auxiliar na análise da repercussão política de ações tomadas pelo governo.
Para este convênio, a fundação se dispôs a deslocar dois profissionais.
R$ 600 a hora de trabalho
A outra parceria será para apoio no monitoramento e controle de contratos da Secretaria de Saúde com Organizações Sociais. No dia 27 de março, Gabriell encaminhou o pedido para a FGV Projetos. A proposta chegou no dia 1º de abril.
A fundação sugeriu que um servidor do estado seja direcionado para ser o líder do projeto e auxiliar o trabalho da equipe da FGV.
A maior parte dos R$ 6,5 milhões seria voltada para o pagamento de cinco profissionais da instituição. Seriam R$ 6,192 milhões para este fim. O gerente executivo, cargo mais alto, receberia R$ 600 por hora de trabalho. Ao longo de um ano, o total previsto é de R$ 403,2 mil, com uma média de 14 horas semanais de serviço.
Quem receberia mais no total seria um profissional pleno. Com uma previsão de 24 horas semanais a R$ 300 cada, ele pode ganhar, ao fim de um ano, mais de R$ 2,4 milhões.

Forte na era Cabral
Muito forte durante as gestões de Sérgio Cabral, a FGV recebeu cerca de R$ 115 milhões neste período, boa parte por contratos de consultoria semelhantes aos que estão prestes a serem assinados pela atual gestão.
Desde que Witzel assumiu, a fundação teve apenas contratos pontuais principalmente para cursos de especialização. Foram cerca de R$ 4 milhões basicamente concentrados na Secretaria de Educação e na Polícia Militar.
A FGV foi citada por Cabral num depoimento em abril do ano passado ao juiz Marcelo Bretas. À época, o ex-governador afirmou que, por ser uma instituição de reputação, “sempre foi usada como um biombo, de cobertura legal para efetivação de entendimentos prévios”, que “fugia da licitação e dava cobertura legal para estudos feitos por nós”.
Cabral, porém, não mencionou pagamento de propina a integrantes da instituição.
Inquéritos no MP
Desde abril do ano passado, a fundação também está sendo alvo de inquéritos do Ministério Público estadual exatamente para investigar contratos assinados sem licitação com o estado.
A primeira investigação é relativa a uma parceria com a Cedae, de 2017 para a precificação de ações da estatal. O MP apura se o número de profissionais que efetivamente trabalharam foi inferior ao contratado, além da legalidade da dispensa de licitação.
Os outros dois inquéritos são relativos a uma consultoria de 2006 para a avaliação de ações do Banco do Estado do Rio de Janeiro (Berj) e a um estudo de avaliação técnica do projeto da Linha 4 do metrô, de 2010.
“Bem-estar social”
A fundação encaminhou a seguinte nota ao blog:
“A FGV Projetos é responsável pela execução de projetos e prestação de serviços de assessoria técnica. Sua missão é contribuir para a excelência das organizações públicas e privadas, bem como para o desenvolvimento do país – através da disseminação do conhecimento utiliza as melhores práticas para cada projeto.
A FGV não tem fins lucrativos. Pela sua própria natureza, a Fundação jamais aufere lucros com os projetos que desenvolve. Com o que recebe pelos projetos que executa, a FGV cumpre sua missão de estimular o desenvolvimento nacional e de auxiliar na solução de problemas básicos do bem-estar social”.
Procurada, a Secretaria de Saúde não se manifestou.
*Foto em destaque: Logotipo da Fundação Getúlio Vargas / Reprodução
“Cabral, porém, não mencionou pagamento de propina para integrantes da instituição”
Fui estudante da FGV, trabalhei na escola de Direito. Acredito que seja uma instituição seria e importante no país. Conforme mencionado por você, não há evidências de propinas.
Qual é o ponto em desenvolver uma matéria em momento tão importante, onde se faz necessário investimentos em saúde e pesquisa, citando o “falecido” Sérgio Cabral e suas maracutaias?
Desculpe mas esta matéria me parece sensacionalista, eu gostaria de conhecer mais sobre os projetos em si, isso é que importa no jornalismo! Forte abraco
Oi, Pedro, tudo bem? A reportagem resume os projetos, mas é possível clicar nos links para ver a proposta completa.
Abraços.