Novo controlador-geral do Estado do Rio, Francisco Ricardo Soares

Pós de R$ 99 é destaque em currículo de novo controlador-geral do Estado do RJ

Sob o comando do governador em exercício do Rio, Cláudio Castro, um ilustre desconhecido assumiu uma das funções mais importantes na fiscalização dos gastos públicos dentro do Executivo fluminense. Funcionário de carreira do Banco do Brasil, o advogado Francisco Ricardo Soares é, desde o dia 15 de setembro, o controlador-geral do Estado.

Sem grandes referências, o nome está sendo visto com desconfiança internamente na CGE. Há o temor de que os trabalhos possam perder força com a mudança de comando. E o currículo do novo controlador, divulgado no site do próprio governo, reforça as dúvidas.

Um dos destaques das duas frases que resumem a biografia de Francisco na página é o fato de ele ter “pós-graduação em Direito Público”. O blog apurou que se trata de um curso de educação à distância oferecido pela Faculdade Legale, com sede em São Paulo. Com um detalhe: ele vem sendo oferecido pela instituição pela bagatela de R$ 99.

No ano passado, a convocação para a pós-graduação foi divulgada num vídeo no YouTube pelo coordenador do curso, o ex-corregedor da Polícia Militar de São Paulo Marcelino Fernandes. Além de professor, ele também se apresenta atualmente como coach e pré-candidato a vereador. Foi criado um site à época (www.pos99.com.br), que não está mais no ar.

“Vamos fazer a pós por 99 reais. Mas não pense você que é 99 reais por mês! Não! É 99 reais a pós inteira! Uma parcela! Uma única parcela de 99, a pós inteira de Direito Público”.

Mais um curso

O blog mandou uma série de perguntas à assessoria de imprensa do Palácio Guanabara a respeito do novo controlador, mas foi enviado apenas um currículo com duas páginas. Como histórico profissional constam duas funções no Banco do Brasil: gerente-geral, de julho de 1997 a outubro de 2011, e superintendente regional, de novembro de 2011 a dezembro de 2016.

O curso mais recente antes do da Faculdade Legale, concluído em maio deste ano, foi um MBA da Fipecafi (Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis), de 2006.

Em sua página no sistema Lattes, Francisco Ricardo Soares também acrescentou outra pós-graduação em andamento na Legale: Direito Médico e da Saúde. Segundo o site da faculdade, este curso sai à vista por R$ 969. O TCC é opcional e a avaliação é uma prova final realizada via Correios.

Na tarde desta terça (22), a reportagem entrou em contato por e-mail com a Legale. Por telefone, um representante disse que não poderia passar detalhes específicos a respeito dos alunos, mas afirmou que a pós a R$ 99 foi uma ação social da faculdade, que ofereceu o curso com a mesma qualidade de outros oferecidos pela instituição. O blog pediu que fossem enviados mais detalhes por e-mail, mas não houve retorno até a publicação.

Investigações na Leão XIII

A CGE tem uma função importante no controle interno para a detecção de mau uso de recursos públicos e apuração dos agentes responsáveis pelos danos. Na gestão Witzel, houve dois ocupantes do cargo de controlador. De janeiro de 2019 a janeiro de 2020, a cadeira foi ocupada pelo delegado da Polícia Federal Bernardo Barbosa. Até este mês, o advogado Hormindo Bicudo Neto, com longa passagem pelo TCE-RJ, esteve na posição.

Na passagem de Bernardo Barbosa, a CGE foi a responsável, por exemplo, pelas primeiras apurações que deram origem à Operação Catarata, que apontaram suspeitas de desvios de verbas da Fundação Leão XIII.

As investigações do Ministério Público acabaram respingando em integrantes do governo. Este mês, na segunda fase da operação, foi preso o ex-secretário estadual de Educação Pedro Fernandes. O próprio governador em exercício, Cláudio Castro, também foi citado no depoimento de um ex-funcionário de uma empresa investigada como recebedor de propina. Ele nega as acusações.

Uma lei de 2018 que dispõe sobre o sistema de controle interno do Poder Executivo determina que os titulares do cargo de controlador-geral devem ter “mais de dez anos de exercício de função ou de efetiva atividade profissional que exija os conhecimentos mencionados e práticas de controle interno no setor público”. O blog questionou o Palácio Guanabara se Francisco Ricardo Soares se enquadra nessa regra, mas não obteve resposta.

Nesta terça, o novo controlador trocou o corregedor-geral da CGE. Saiu o analista de controle interno Eduardo Sérgio da Costa, que ocupou o cargo durante toda a gestão Witzel, e entrou o auditor do estado Oswaldo Gomes de Souza, que estava na Secretaria de Turismo. O corregedor-geral é responsável, por exemplo, pela abertura de processos de responsabilização de empresas.

Problemas na Saúde

Não é só na CGE que há incerteza a respeito dos trabalhos de auditoria. Documentos de exonerações de cargos-chave na Corregedoria, na Controladoria e na Ouvidoria da Secretaria de Saúde chegaram a ser incluídos este mês no Sistema Eletrônico de Informações (SEI). No entanto, não houve nenhuma publicação em Diário Oficial.

Nesta terça, o corregedor da Secretaria de Saúde, Thiago Couto Lage, enviou um ofício pedindo uma reunião com o novo controlador-geral do Estado. No documento, ele cita “dificuldade na continuidade dos trabalhos” voltados para a responsabilização de envolvidos na compra de respiradores e na construção de hospitais de campanha.

Ele cita ainda que, desde 4 de setembro, a pasta está sem subsecretário de Controladoria Geral, “autoridade que poderia eventualmente contribuir com uma alternativa para que os trabalhos não fiquem parados”. E afirma que o secretário estadual de Saúde, Alex Bousquet, “foi cientificado da situação e até a presente data não retornou o questionamento”.

O controlador Francisco Ricardo Soares repassou a função de realizar a reunião para o novo corregedor-geral, Oswaldo Gomes de Souza, em até dois dias.

*Foto em destaque: Novo controlador-geral do Estado do Rio, Francisco Ricardo Soares / Divulgação

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