OS Ideas assume Hospital Alberto Torres

OS que mais cresce no Estado do RJ repassou recursos para empresa de seu diretor executivo

Organização Social que mais cresce em contratos com o governo do Estado do Rio, o Instituto de Desenvolvimento, Ensino e Assistência à Saúde (Ideas) está repassando recursos recebidos para a gestão do complexo do Hospital Alberto Torres, em São Gonçalo, para uma empresa que pertence ao próprio diretor executivo da entidade, Sandro Natalino Demétrio.

Apesar de o site da OS ter uma grande lacuna na publicidade de dados, principalmente em relação às subcontratações realizadas, o blog localizou, num relatório de fevereiro, uma tabela em que aparece a Metanetworks Tecnologia, Inovação e Gestão LTDA. A companhia recebeu, só naquele mês, cinco pagamentos, somando R$ 57,5 mil, a título de “assessoria e consultoria administrativa”.

Com sede na cidade de Palhoça (SC), a empresa foi criada em janeiro de 2019 e tem um capital social de apenas R$ 5 mil, de acordo com os dados que constam no site da Receita Federal. Além de ter Sandro como sócio-administrador, também pertence a Mabile Gatelli.

Abaixo, um trecho da tabela que mostra parte dos repasses efetuados para a Metanetworks. Há ainda referência de pagamento ao próprio Sandro Natalino Demétrio, mas não fica claro se poderia se encaixar na sua remuneração de diretor executivo, já que consta somente a rubrica “aluguel e afins”.

Falta de dados

Não é possível saber, pelo que foi disponibilizado publicamente até agora pela Ideas, se esses foram os únicos repasses efetuados pela OS à empresa. O site da entidade não traz as tabelas com os fornecedores contratados para a gestão do Complexo do Alberto Torres em si. Há apenas dados genéricos com os valores de cada serviço (insumos, pessoal, exames etc).

A Metanetworks apareceu num trecho específico que trata do chamado “rateio de sede” do mês de fevereiro. Pelas regras atuais no Estado do Rio, as Organizações Sociais têm direito a destinar até 3% do valor do contrato para despesas com sua administração central.

Na prática, tem havido uma série de problemas relacionados a esses repasses. Um relatório concluído em dezembro de 2019 pela Controladoria Geral do Estado (CGE) constatou que ao menos três entidades (Instituto dos Lagos Rio, Pró-Saúde e HMTJ) praticaram, entre 2016 e 2018, irregularidades como a apresentação de documentos de comprovação dos gastos insuficientes e despesas acima do limite permitido.

R$ 215 milhões

Ao todo, a Ideas já recebeu do Estado do Rio R$ 215,4 milhões em pagamentos. A OS começou a atuar em outubro do ano passado com o governo fluminense, quase que simultaneamente no Complexo do Alberto Torres e no Hospital Zilda Arns, em Volta Redonda. Mais recentemente, também ganhou o contrato de gestão do Hospital Modular de Nova Iguaçu.

Apesar dos contratos vultuosos, o blog não localizou no Sistema Eletrônico de Informações (SEI) do estado dados referentes à fiscalização dos gastos realizados até agora pela OS. Por enquanto, constam basicamente avaliações sobre o cumprimento de metas de atendimento estabelecidas para cada unidade.

Mesmo tendo vencido a seleção para o Hospital Modular, a própria comissão responsável pela avaliação dos concorrentes detectou problemas de transparência no site da Ideas. A entidade teve a pontuação zerada (numa escala de 0 a 2) na avaliação da publicidade dos dados sobre as subcontratações.

Mais um diretor

Além da empresa do diretor executivo Sandro Natalino Demétrio, o blog também localizou, no relatório de fevereiro dos repasses de “rateio de sede” relativos ao Alberto Torres, a Ativa Ação Integral à Vida. Essa companhia pertence ao atual diretor da unidade, Raphael Riodades.

Neste caso, aparece um pagamento de R$ 16 mil a título de “acompanhamento da execução de contratos em unidades do Ideas”. No Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), por sua vez, Riodades aparece, no setor público, como celetista de 12 horas para clínica médica no Alberto Torres, e como diretor de Serviços de Saúde do Hospital municipal Che Guevara, em Maricá, com carga horária de 24 horas.

Há uma resolução de 2016 da Secretaria estadual de Saúde que estabelece que os diretores de Organizações Sociais não podem ter vencimentos maiores do que o do secretário da pasta, atualmente R$ 18,4 mil mensais.

Outro artigo diz que “são vedadas as contratações de bens e serviços de empresas vinculadas a familiares de qualquer autoridade assistencial ou administrativa das OSs”. Nos casos de Sandro e Raphael, parece ser ainda mais claro porque eles próprios são sócios das empresas.

É bom lembrar também que as Organizações Sociais, ao menos na teoria, não têm fins lucrativos.

Irregularidade recorrente

Não é de hoje, aliás, que há repasses dessas entidades para empresas ligadas a seus próprios dirigentes no Estado do Rio. Em junho do ano passado, o blog mostrou que o Instituto dos Lagos Rio havia se transformado num verdadeiro negócio de família, com contratações de companhias ligadas a parentes do responsável médico da entidade, Juracy Batista de Souza Filho.

Na mesma época, o Ministério Público fez uma operação com foco nessa Organização Social exatamente por causa dessas subcontratações. Em seguida, a Lagos Rio trocou de direção. A entidade saiu da gestão do Alberto Torres no fim de setembro, e quem entrou em seu lugar foi a Ideas.

A reportagem enviou uma série de questões à Secretaria de Saúde e à Organização Social a respeito das subcontratações e da falta de transparência, mas não houve retorno. O espaço segue aberto.

*Imagem em destaque: Hospital Estadual Alberto Torres, administrado pela OS Ideas / Divulgação

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