Autorizar despesas, abrir licitações, assinar contratos e movimentar contas bancárias são algumas das funções do atual subsecretário executivo de Educação do governo de Wilson Witzel, João Marcos Borges Mattos. Traduzindo para um português mais claro, ele é o principal encarregado de tomar conta do dinheiro da pasta que administra a combalida rede de ensino fluminense.
Tudo muito bom, tudo muito bem, não fosse por sinais de alerta que vêm do passado do dentista, de 42 anos. Aliado de longa data do secretário de Educação, Pedro Fernandes, o subsecretário é réu por improbidade administrativa, numa ação movida em 2015 pela Prefeitura de Resende, no interior do estado. Segundo documentos que constam do processo, auditores do município apontaram um prejuízo estimado em R$ 190,2 mil aos cofres públicos, com a participação de João Marcos, que foi presidente da Fundação Hospitalar de Resende entre 2009 e 2013.
Basicamente, a acusação afirma que materiais cirúrgicos comprados com a anuência de João Marcos Borges Mattos junto à empresa Biolife Comércio de Material Hospitalar não foram entregues, causando o dano ao município. E o andamento do processo não tem sido favorável ao atual subsecretário estadual de Educação: em outubro de 2017, a 11a Câmara Cível do Tribunal de Justiça negou o recurso da defesa do dentista para que parte dos seus bens, que servem de garantia para um possível ressarcimento, fossem desbloqueados. Ele alegou, sem sucesso, que a medida judicial causou transtornos “a um pai de família, com filho pequeno, em idade escolar”.
Em julho do ano passado, o juiz da 2a Vara Cível de Resende Hindenburg Pinto da Silva, que analisa o mérito da ação, determinou a continuidade do processo. “Os fundamentos expostos pelos réus, em juízo de cognição sumária, não são suficientes para comprovar as suas alegações. Ademais, com os documentos acostados na inicial, há justa causa suficiente para o recebimento da ação por ato de improbidade”, afirmou em seu despacho.
Multa do TCE por “ilegalidade em contrato”
Mas a ação por improbidade não é o único problema de João Marcos. No fim do ano passado, a presidente do Tribunal de Contas do Estado (TCE), Marianna Willemann, determinou que fosse inscrita na Dívida Ativa uma multa de cerca de R$ 17 mil ao dentista por considerar que houve ilegalidade num convênio celebrado por ele em 2014, quando exercia o cargo de subsecretário estadual de Direitos Humanos. À época, o governador era o hoje presidiário Sérgio Cabral. E o secretário estadual de Direitos Humanos, Pedro Fernandes.
O convênio, assinado com a Cruz Vermelha Brasileira, era para a realização, em Volta Redonda, de um projeto chamado “Rio Mova-se”, que tinha como objetivo levar serviços de assistência social e fisioterapia a idosos. Custou, segundo o TCE, R$ 3,8 milhões. Mas, para a presidente do tribunal, “não houve documentação emitida por órgão oficial de fiscalização capaz de comprovar que a estrutura e o funcionamento prévio da entidade beneficiada eram satisfatórios para o desenvolvimento das ações”.
Em seu voto, Marianna Willemann ainda pede que a Auditoria Geral do Estado apure e quantifique o possível dano ao erário.
Advogados e mulher também ganham cargos
Além de João Marcos, pessoas próximas ao atual subsecretário executivo de Educação também foram contempladas nos últimos tempos com cargos por Pedro Fernandes. É o caso dos dois advogados que representaram o dentista no recurso que pedia que seus bens fossem desbloqueados. Maria Eduarda Lopes Cunha de Oliveira estava nomeada no ano passsado no gabinete de Fernandes na Alerj, com salário de R$ 14 mil, segundo a última folha de pagamento da Casa disponível, de novembro. Já Sérgio Bernardino Duarte tem atualmente um cargo de assessor na Secretaria de Educação.
Com várias passagens pelo Executivo, Bernardino tentou uma vaga de deputado estadual na eleição do ano passado, usando nas urnas o nome “Sérgio Fernandes”. Teve cerca de 33 mil votos e conseguiu apenas ser suplente.
A mulher de João Marcos, Laila Fabiane Rettore Mattos, estava nomeada no ano passado no gabinete de Pedro Fernandes na Alerj. Segundo a folha de novembro, seu salário era de R$ 5,7 mil.
Laila divide com o marido a sociedade da empresa Vulpecula Consultoria e Gestão, com sede em Petrópolis, na Região Serrana. Ela ainda é sócia da Quali Clínicas Gestão e Serviços de Saúde, que fica na Barra da Tijuca, e do Núcleo Odontológico Resende, no município do interior do estado.
Licitações grandes por vir
João Marcos foi nomeado subsecretário executivo de Educação logo em 1o de janeiro, dia em que o governador Wilson Witzel assumiu o cargo. No dia 3, foi assinada a resolução do secretário Pedro Fernandes que deu ao dentista o controle das principais funções financeiras da pasta. Outros subsecretários também foram designados para a administração de recursos, porém com menos poder.
Apesar da grave crise que assola o estado, a Secretaria de Educação movimentará altas quantias nos próximos anos, inclusive na área de investimentos, caso se concretize o discurso adotado por Pedro Fernandes nos últimos dias. Em entrevista à TV Globo, ele afirmou a pasta deverá lançar nos próximos dias uma licitação para a compra de 25 mil aparelhos de ar-condicionado. Outra intenção é construir 12 novas escolas para suprir um déficit por vagas diurnas.

Deputado estadual por três mandatos e com passagens ecléticas pelo Executivo, tendo sido secretário de Cesar Maia a Crivella, passando por Luiz Fernando Pezão e Sérgio Cabral, Pedro Fernandes ficou em quinto lugar na disputa pelo governo estadual no ano passado. Tido como provável aliado de Eduardo Paes no segundo turno – chegou até a fazer uma “tabelinha” com o ex-prefeito num dos debates -, acabou colando no ex-juiz federal Wilson Witzel.
O amor à primeira vista foi se consolidando e Fernandes foi contemplado com o cargo de secretário de Educação. Foi ele, por exemplo, quem lançou na campanha do primeiro turno a bandeira do fim da vistoria do Detran, também assumida por Witzel, e que vem causando polêmica nas primeiras semanas de gestão.
Com passagens por diversos partidos, Fernandes disputou a eleição pelo PDT, mas saiu da legenda conforme sua aproximação com Witzel foi se consolidando. A indicação do ex-deputado para o cargo atual não foi bem recebida principalmente entre parlamentares do PSL, partido de Jair Bolsonaro, que deram apoio ao ex-magistrado na corrida pelo governo do estado.
Transparência e anticorrupção
No dia 3 de janeiro, mesmo dia em que deu poderes de gestão de finanças da pasta para João Marcos Borges Mattos, réu por improbidade, Pedro Fernandes assinou um documento intitulado “Declaração de Transparência, Governança e Anticorrupção – Governo Um Novo Rio Começa Agora”, assim como o governador Witzel e todos os outros secretários.
Entre os itens do documento estão, entre outros, “promover maior acesso à informação e divulgação de atividades e gastos, não se limitando à Lei de Acesso à Informação; implementar os mais altos padrões de integridade profissional e exigir altos padrões éticos e morais”.
O blog contactou a assessoria de imprensa da Secretaria de Educação no início da tarde desta quinta (31) para pedir esclarecimentos de Pedro Fernandes sobre as nomeações e a João Marcos sobre a ação por improbidade e o processo do TCE, mas nenhuma resposta foi enviada até a publicação inicial deste texto.
O espaço segue aberto para qualquer manifestação dos citados.
Foto em destaque: O subsecretário de Educação Joâo Carlos Mattos, em reunião em janeiro de 2017, quando era secretário estadual de Assistência Social. Crédito: divulgação.
2 comentários