O Witzel de 3 anos atrás não pregava o abate. “Isso é cortina de fumaça”

Nada de “abate“, “tiro na cabecinha” ou qualquer outra frase de efeito na linha “bandido bom é bandido morto”. Uma palestra do então juiz federal Wilson Witzel, realizada em julho de 2016 na Academia Brasileira de Filosofia, mostra um magistrado com um discurso bem mais moderado do que o do atual governador do Rio.

Apesar de o tema do fórum ser “Segurança pública: desafios de uma sociedade em guerra”, Witzel, à época presidente da Associação de Juízes Federais do Rio de Janeiro e Espírito Santo (Ajuferjes), passou longe do tom bélico de seus pronunciamentos atuais. Nos momentos finais de sua participação, fez a seguinte afirmação:

“Não há outra saída, meus amigos. Não acreditem que juiz, delegado, promotor, Polícia Militar vão resolver o problema (da Segurança Pública). Isso é só uma cortina de fumaça. Nós somos vítimas de uma sociedade doentia, por uma corrupção endêmica, falta de vergonha, respeito e de dignidade”.

Veja a íntegra da palestra:

“Sem emprego, no tráfico”

Nos 23 minutos na mesa da Academia Brasileira de Filosofia, Witzel não usou, por exemplo, a expressão “narcoterroristas” para se referir aos traficantes de drogas, como fez em seu discurso de posse como governador. Ao contrário, o então juiz procurou contextualizar a criminalidade no quadro social e econômico vivido no Estado do Rio:

“Quando a economia vai mal, o Direito Penal tende a aumentar… A quantidade de prisões por tráfico de drogas… Porque ele não tem emprego, ele vai trabalhar no tráfico”.

Em agosto passado, o governador, por sua vez, adotou a linha bélica que vem tendo desde a campanha.

“Não sai de fuzil na rua, não. Troca por uma bíblia. Porque, se você sair, nós vamos te matar”, afirmou, em entrevista com Antonia Fontenelle.

“Há uma segregação”

O Witzel de 2016 mal fala em polícia no seu discurso sobre segurança pública. Seu principal foco é a corrupção. E os efeitos sociais dela:

“O Brasil é um dos países mais corruptos do mundo, sem transparência. E essa efervescência acaba desaguando na ausência de políticas públicas para a sociedade. Política de inclusão social… Quem aqui vai colocar o filho numa escola pública? Quem aqui vai ser atendido no SUS? Há uma segregação, e essa sociedade segregada se sente completamente desamparada. O sujeito da comunidade se sente abandonado pelo Estado”.

Durante a campanha, ano passado, o governador afirmou que matricularia seus filhos em escolas públicas e também buscaria atendimento médico na rede pública. Em janeiro, fez um check-up no Hospital Pedro Ernesto, da Uerj, mas acabou sendo criticado porque teria “furado a fila” da unidade. Sua assessoria disse médicos de folga fizeram o atendimento.

Em maio, quando passou mal, Witzel foi atendido no Hospital Samaritano, uma das unidades particulares mais caras da cidade.

Neste domingo (22), o ex-juiz postou, em seus stories no Instagram, uma foto de costas com a filha na fila para a prova do Colégio Militar.

“Direito Penal não resolve”

Na palestra de 2016, o magistrado aponta diversas vezes para a necessidade de mudanças na política e para o combate à corrupção. Apesar de ser juiz à época, ele afirma que não acredita no Direito Penal como solução para a segurança pública:

“Sinceramente, eu estou desacreditado que através do Direito Penal a gente vai resolver alguma coisa. Nós temos que assumir o compromisso de ser mais sérios na escolha dos nossos representantes políticos e de quem vai ocupar a cadeira de prefeito, a cadeira de governador do Estado do Rio de Janeiro”.

Após ressaltar a importância de investimento em turismo no estado, como forma de “tirar as pessoas da comunidade para trabalhar nos hotéis”, Witzel conclui:

“Já estou careca de saber. Não há como resolver o problema da Segurança Pública se nós não combatermos a corrupção que leva à ausência de políticas públicas. Porque o corrupto não tem compromisso com nada. Só com quem deu dinheiro e botou no bolso dele”.

De juiz a político

Pouco mais de dois anos depois da palestra, Wilson Witzel deixou a magistratura para concorrer ao cargo de governador do Rio. Escolheu o PSC, comandado por Pastor Everaldo, para a missão. Tornou-se advogado do partido, com direito a salário de carteira assinada, mesmo durante o período da campanha eleitoral.

Já durante a campanha adotou o lema de “abate de bandidos”, numa linha ainda mais dura até do que a da família Bolsonaro e do que o atual ministro da Justiça Sérgio Moro. Em vez de mudanças na legislação, no que se refere ao chamado “excludente de ilicitude”, Witzel vem defendendo que o próprio Código Penal já permite ao policial “abater” alguém que esteja portando uma arma de uso restrito.

Se na palestra do passado mal falava em polícia como solução para a segurança pública, atualmente tem esse como seu tema principal.

E, em menos de um ano de governo, pode-se dizer que ficou marcado por duas imagens ligadas à violência. Em maio, esteve num helicóptero, em Angra, que atirou numa tenda de orações.

Em agosto, saiu de um helicóptero comemorando, após a morte de um sequestrador, na Ponte Rio-Niterói.

Fica então a pergunta: são o juiz Witzel de 2016 e o governador Witzel de 2019 a mesma pessoa?

*Foto em destaque: Governador Wilson Witzel em entrevista coletiva após o sequestro de um ônibus na Ponte Rio-Niterói / Phillipe Lima / Divulgação

Um comentário

  1. Vejo Witzel como mais um demente de curso superior, um bi-polar perigoso com tendencia ao falso moralismos, esperto procurando furtar o erário com discurso de extremo rigor ao crime mas que na verdade vai servir para adquirir bens que vão gerar comissões de CX2 e sempre vinculado a beira do extremo necessário e com urgência como é o caso recente do metrô-Rio onde faz propostas descabidas com o claro intuito de aterrorizar para conquistar o que deseja. Esse é na MINHA OPINIÃO o perfil psicopata do governador, inteligente, perspicaz que representa um perigo aos cofres públicos também, porem em estilo próprio. Espero estar enganado, mas vou deixar registrado.

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